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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Fenômeno



Quando dei por ti, estavas impregnada nos meus dias. Não digo que dei por mim, porque quando percebi... Eu já era inteiramente tua e sequer me pertencia. 

Estás no espreguiçar matutino, nas pernas erguidas na rede, iluminadas pela luz vespertina. Estás principalmente nos pensamentos rotineiros que antecipam o sono profundo, e enquanto eu peço baixinho pra que sempre te tenha inserida no meu dia-a-dia, noite-a-noite. 

Quando dei por nós, eu já não me cabia de tanto afeto, porque transborda demais. Mas ao mesmo tempo, eu caibo dentro de ti, e esse espaço basta por si só. 

Mas eu sempre fui rio: águas turvas, profundas, porém doces. E a princípio tive muito medo também, pois só havia encontrado poços escuros e rasos. Afogava-me a pequenez das enxurradas alheias. Sufocava-me o fato de todo mundo dar pé. E então, te apresentaste: mar infinito de água cristalina! O medo passou para temor da tua imensidão; do teu sal me destruir e a fusão das incontáveis gotas resultar em uma catástrofe natural. 

A verdade é que tinha me acomodado em ser quem amava mais; quem se entregava por completo. Encontrar alguém que correspondia à intensidade dos mergulhos me deixou sem areia, sem praia, sem chão, pois tu encharcas qualquer sertão. 

Eu, acostumada a me envolver com a carência de líquidos outrora - experiências rarefeitas de carinho -, ali me senti quase insuficiente. Não contive a surpresa ao notar reciprocidade plena (ondas calmas e não revoltas, por haver equilíbrio). 

Agora é evidente minha pura insegurança... Não fico mais à margem de nenhuma desconfiança: não há felicidade maior que amar sem medidas na mesma medida. Percebo a beleza nos fluidos dessa troca: eu deságuo em ti, e em nós... Pororoca.

domingo, 11 de agosto de 2013

Pastoril


Peço-te encarecidamente
Que me guies eternamente:
Como ovelha de teu rebanho,
Como prova de amor tamanho,
Como temor de que, um dia, me percas.

Peço-te atenção,
Que este pampa é de imensidão:
Como campo que não se finda,
Como planície a perder de vista,
Como certeza de que o sol sempre se ergue.

Peço-te cuidado
Que este torrão é teu, ser amado:
Como as gotas que cabem em um rio,
Como a dedicação de um pastoril,
Como a segurança de que o infinito nos cerca.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

SOUL-venirs


Há vida nas coisas inanimadas
A partir do momento em que adquirem significados.
Se acaso, com carinho, são tocadas,
Ganham a bênção de trazer recados.

Há vida nas coisas inanimadas
Quando remetem a histórias, memórias e espaços.
Despertam a nostalgia de datas
E relembram antiquíssimos laços.

Há vida nas coisas inanimadas
Porque as relações assim as revigoram, inconscientes.
Alianças, retratos, cartas, camisas desbotadas:
O amor dá à luz até a objetos inocentes.

Há vida nas coisas inanimadas
Porque o homem vê nelas o reflexo de seus erros.
Cada
souvenir é um ano de decisões equivocadas:
A mobília é um relicário de segredos.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Mea Culpa


Dos meus erros estou ciente
Do quanto fui inconsequente
E arrependo-me pelos meus atos.
Independentemente dos fatos,
Minha culpa eu carrego sozinha:
Acolho a dor que se avizinha
Como preço pela minha culpa.
Ainda que eu implore perdão ou desculpa,
Que seja para quem possuo a dívida.
Não aceito intromissões na minha vida,
O olhar de desprezo alheio e a língua ferina atroz,
Pois minha própria consciência já é meu pior algoz.