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quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Colarinho


recentemente descobri
que sempre bebi errado.
vi um vídeo no Facebook
com um truque:
a cerveja tem que ter colarinho
por causa do dióxido de carbono
caso contrário
há uma reação química no organismo

recentemente percebi
que sempre amei errado.
vi coisas aparentemente simples
com mais clareza:
o amor tem que por as cartas na mesa
por causa da franqueza
caso contrário
nos engasgamos com aquilo que escondemos

e eu engolia cerveja sem colarinho
e eu engulo certezas e sentimentos

não sou como Bukowski
com um pássaro azul no coração
não sou como os apaixonados
com borboletas no estômago
sou como uma esponja
que absorve palavras tóxicas
e suporta calada
até se encharcar

qualquer dia desses explodo
como vulcão em erupção;
qualquer dia desses transbordo
como autodestruição...

qualquer dia desses não me caibo mais.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Afinal


eu vou te amar pra sempre
podes contar comigo sempre
sempre estarei ao teu lado
quero ficar contigo pra sempre

a ternura do eterno:
tensão contratual
[contraste moderno]

quanto tempo dura o pra sempre?
pra sempre é muito tempo.
o tempo do pra sempre
talvez não seja o tempo dos homens.
então por que cargas d'água
sempre juramos pra sempre?

quiçá estejamos sempre
equivocados:

o pra sempre dura
enquanto se sente.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Esmaecimento


onde escondeu-se a paz?
em que ponto do caminho
deixei, enfim, para trás
todo aquele carinho?

ando um tanto confusa
a respeito de quem és:
já não sei se me usas
ou se estou a teus pés

e por não lembrar mais
abro uma fenda no tempo:
entre o nunca e o jamais
guardo o esquecimento

do que tínhamos
do que sonhávamos
do que poderíamos
do que teríamos

com a visão embaçada
permaneço confortável:
minha companhia se alinha
ao meu eu domesticável

sequer sinto tua falta
e nem me torturo em vão;
quando a dor me assalta
reservo-a em um porão

em um baú
em um cofre
em um erário cru
em uma caixa nobre

e aos poucos te transformas
[tomas a forma de teus erros]
e depressa te deformas
[em meio ao nosso enterro]

assim, a cama espaçosa
já não clama tua presença
tampouco a pele amorosa
requisita a benquerença

o restante? nem importa.
agora não me iludo
pois o que me reconforta
é saber que fiz de tudo...

só abri mão
só me d(o)ei em entrega
só desgastei coração
só apaguei quem eu era.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Condição Atmosférica




Amapá:
leves pancadas de chuva
sexta-feira, 36°C
não esqueça o guarda-chuva


o mormaço se levanta
nuvem espessa, muita lama
nos jornais a apresentadora avisa:
dia quente, meio-dia


fim de tarde:
vento forte, umidade...


o homem meteorológico
não consegue prever o tempo.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Epílogo

Constatação terrível:
o plano era infalível
antes de falhar.
Eis que nossos corações
[preenchidos pelo ontem]
se cansaram de esperar.


Quimeras críveis:
os sonhos mais difíceis
eram fáceis de lidar.
Eis que o caminho pesado
[cheio de findas outroras]
passou do tempo de bifurcar.

Proteções antígenas:
as mãos dadas - e frutíferas -
eram leves de agregar.
Eis que o laço tão ameno
[repleto de pretérito]
é nó de chumbo pra amarrar.

União compulsória:
presas pela memória,
na dúvida de superar.
O que foi e não é mais faz voltar atrás,
e na tentativa de ser outra vez,
de novo a se frustrar...

[por aquilo que já se desfez].